João Teixeira em entrevista ao Maisfutebol: uma viagem do início da carreira no Benfica à experiência no Wolverhampton, ao lado de vários outros portugueses, mas com um olhar sempre no que se passa no Estádio da Luz. Venha daí...
O miúdo de rosto fechado fala como joga, com um ar grave. Só não aceita que lhe sugiram que é mais sério do que os outros por causa disso.
«Sério, eu? Não, nada disso. Quando tenho de brincar, brinco», atira, a meio de uma conversa que vai de uma ponta à outra: do início da aventura no Benfica ao empréstimo ao Wolverhamtpon. Onde, aliás, está a ser muito feliz.
Mas por partes.
Antes de mais convém referir que João Teixeira nasceu em Amora e começou a jogar aos oito anos no clube da terra. Três épocas depois, saltou para o Benfica.
«Como? Foi simples. Os olheiros do Benfica foram ver jogos do Amora, como era normal, viam jogos um pouco por todo o lado, e depois convidaram-me para fazer uns testes, juntamente com outros miúdos de todo o país», conta.
«Acabei por fazer uma série de treinos, passei as fases todas e assinei contrato de formação. No ano a seguir comecei a treinar no clube.»
Para um miúdo benfiquista, com um pai benfiquista, aquilo era um raio de felicidade em casa. Mas João Teixeira confessa que não fez muito burburinho.
«Se me torneio ídolo na escola? Não, não. Só os meus amigos é que sabiam que andava no Benfica. De resto ninguém sabia. Quando era miúdo só queria era jogar à bola.»
Nas escolinhas do Benfica, João Teixeira integrou uma geração de luxo, ao lado de nomes como João Cancelo, Bernando Silva, Diego Lopes, Ricardo Horta, Hélder Costa, André Gomes, José Sá, Bruno Varela, Bruno Gaspar e Ivan Cavaleiro, por exemplo.
«Sinto que faço parte de uma geração especial do Benfica. Sim, isso sinto. Tínhamos bons jogadores, ganhávamos títulos na formação e éramos uma geração cheia de jogadores com muito potencial», sublinha.
«Era uma geração promissora e acarinhada pelo Benfica. Eu, pelo menos, sempre me senti acarinhado. Sempre me senti bem no clube, bem tratado.»
Hoje boa parte destes jogadores estão em grandes clubes europeus. No Barcelona, no Valencia, no Mónaco, no FC Porto ou no Benfica.
O que prova que a aposta do clube na formação deu certo.
João Teixeira, com o rosto fechado e a voz grave, não entra em assuntos políticos. Diz apenas que se formou um grupo de bons amigos e que guarda com saudades a memória desses tempos.
«O Hélder Costa, por exemplo, está comigo desde que eu cheguei ao Benfica. Éramos da mesma equipa. Somos amigos há doze anos. É uma amizade à prova de ferro», refere.
«A quem era mais difícil tirar a bola nos treinos? Havia muitos, mas acima de todos acho que o Bernardo Silva. Já na altura tinha uma técnica incrível.»
O Seixal acabou por se tornar a casa dele. Dele e da família, refira-se, já que até o pai foi trabalhar para o Centro de Estágio, como segurança do complexo.
«Mas tentávamos manter a distância. Cada um estava no seu sítio e fazia o seu trabalho. Tanto era assim que muitos colegas meus não sabiam que o meu pai trabalhava lá. Se ele tinha liberdade para me puxar as orelhas? Não, não, nada disso. Ele estava lá a fazer o trabalho dele. Depois em casa lá falávamos.»
Por falar em casa, importa dizer que a distância nunca foi um problema. João Teixeira não teve que abandonar os pais ou fazer muitos sacrifícios para jogar à bola no Benfica. Vantagens de viver a cinco quilómetros do Seixal.
«Só tinha de apanhar o autocarro. Estava na escola, saía, apanhava o autocarro e ia para o Centro de Estágios. Era um pulinho», atira, lembrando as dificuldades que sentia em outros colegas, que eram deslocados e ficavam longe da família.
«Eu vivia mesmo ali ao lado.»
Hoje, curiosamente, está longe. O Benfica emprestou-o ao Wolverhampton, da II Liga inglesa, onde João Teixeira tenta somar ritmo, experiência e intensidade.
«O Benfica é o Benfica e é sempre um objetivo regressar. Na minha mente está isso em primeiro lugar. Mas isto é passo a passo. Eu penso muito na minha carreira ano a ano, e para este ano quero jogar o maior números de jogos possível. Depois logo se vê», atira.
«O objetivo é que seja cada vez melhor, cada vez mais forte. Este empréstimo ao Wolves fez com que jogasse num clube bom, com boas infraestruturas e num campeonato evoluído. Agora quero jogar sempre e quero crescer como jogador e como homem.»
Para trás João Teixeira deixou três pré-épocas no Benfica.
A primeira com Jorge Jesus, as duas últimas com Rui Vitória. O que torna obrigatória a pergunta: com qual deles gostou mais de trabalhar?
«Não vou entrar em polémicas. Gostei de trabalhar com os dois, na verdade. São ambos muito bons treinadores, cada um com o seu feitio, claro, que são muito diferentes.»
Certo, vamos ao essencial então.
As duas primeiras pré-épocas serviram para João Teixeira segurar um lugar no plantel, embora nunca se tenha afirmado no onze, e este ano nem no plantel ficou: foi logo cedido.
«Se Rui Vitória tem falado comigo? Não, não tem falado. Nunca falou, nem ele, nem ninguém do Benfica. Mas também não preciso», sublinha.
«Sabemos que eles nos acompanham e que veem o que estamos a fazer.»
Em Inglaterra, de resto, João Teixeira tem a companhia de uma colónia portuguesa, com raízes benfiquistas: Hélder Costa, Ivan Cavaleiro, Sílvio, mais Ola John.
Não serão portugueses a mais para um clube só?
«Eu não vejo muito a imprensa, até porque percebo pouco de inglês, mas sei que os adeptos gostam de nós. Veem-nos como jogadores de qualidade e que vêm para ajudar. É pena que a época não esteja a ser muito boa», refere, lembrando o 19º lugar da equipa na classificação.
«Começou bem, agora piorou bastante. Mas por exemplo a mim está a correr-me bem. Fiz 17 jogos e dois golos, está a ser bom.»
E no seio do grupo, uma invasão de tantos portugueses, foi bem recebida?
«Sim, sim, desde o início que fomos muito bem recebidos. As pessoas aqui são muito simpáticas e respeitadoras. Por acaso foi uma das coisas que me surpreendeu», conta.
«Desde o início que se metiam connosco, faziam perguntas sobre a vida, como estávamos, se estávamos a gostar, se já tínhamos casa... É boa gente, tranquila. Nada a apontar. Bons colegas.»
Ah é? E já têm casa?, insiste-se, em tom de brincadeira.
«Sim, cada um tem a sua casa», responde.
«Claro que depois nos juntamos a todo o tempo: vamos almoçar, vamos jantar, reunimo-nos para estarmos juntos, enfim. Geralmente almoçamos no clube e depois vamos jantar fora, embora às vezes também jantemos em casa. O Ivan Cavaleiro diz que cozinha muito bem e nós vamos lá a casa dele. E na verdade cozinha, cozinha bem.»
João Teixeira refere, de resto, que a presença de outros portugueses foi essencial para a mudança correr tão bem: não era um mudança simples.
«Mesmo para comunicar aqui em Inglaterra, ajudou-me ter outros portugueses. Para além de que me faziam companhia», garante.
«Eu não falo muito inglês. Nunca fui muito bom a inglês e não o sou agora, embora esteja a ter aulas. Falo só o básico e vai dando para compreender. Felizmente tenho o Hélder Costa e o Ivan Cavaleiro sempre comigo, eles são os que falam melhor inglês e ajudam-me.»
Depois, claro, matam saudades de Portugal em grupo.
«Juntamo-nos para ver os jogos do Benfica, por exemplo. Já perdemos alguns, por causa dos nossos próprios jogos, mas sempre que os horários não coincidem, vemos o Benfica juntos, a torcer por mais uma vitória», conta.
«Ainda no último domingo, no clássico, eles viram o jogo juntos. Eu não porque tinha cá outros amigos, vi com esses amigos, mas eles estavam juntos.»
O que permite acabar com uma pergunta óbvia: que Benfica tem visto?
«É o Benfica de sempre, o Benfica que nos habituou a ganhar. Para nós não é novidade. Mas é um gosto ver este Benfica com o Nélson Semedo, o Guedes, o André Horta, jovens formados no clube. É um estímulo para todos nós.»
João Teixeira, apesar dos 22 anos, ainda não perdeu a esperança de se tornar um desses jovens formados no clube a defender a camisola encarnada.
Afinal de contas ele chegou a ser a cara mais evidente dessa geração especial do Benfica.
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