Grandes feitos: Campeão Mundial Interclubes (1968), Tricampeão da Copa Libertadores da América (1968, 1969 e 1970), Campeão da Copa Interamericana (1969) e Campeão Argentino (1967).
Time base: Poletti; Madero, Malbernat, Aguirre Suárez e Medina; Pachamé, Bilardo e Togneri, Flores (Ribaudo), Conigliaro (Echecopar) e Verón. Técnico: Osvaldo Zubeldía.
“Quando o pequeno se tornou gigante”
Até o ano de 1967, a Argentina era dominada por um grupo composto por cinco grandes clubes: Boca Juniors, River Plate, Independiente, Racing e San Lorenzo. Ninguém podia com eles, ninguém tinha mais títulos que eles e nenhuma equipe se atrevia a interferir na hegemonia dos titãs. Não até um clube de La Plata chamado Estudiantes “ensinar” os “professores” a conquistar canecos em sequência com uma zaga fortíssima, jogadas ensaiadas a exaustão e craques específicos para cada setor do campo. O Estudiantes de 1967-1970 entrou para a história como o primeiro tricampeão consecutivo da Copa Libertadores e pela incrível ascensão de um clube até então pequeno na Argentina ao topo do mundo. Os bailes de Verón, Bilardo, Malbernat e Togneri foram regidos pelo maestro Osvaldo Zubeldía, técnico que chegou ao clube com o simples objetivo de não deixar a equipe frequentar a zona de rebaixamento. Porém, o treinador fez “um pouquinho” mais que isso… É hora de relembrar o período mais glorioso da história desse grande clube argentino.
Objetivo: não cair!
Depois de uma década terrível, com rebaixamentos e problemas, o Estudiantes entrou na década de 60 mais esperançoso. O time investia nas categorias de base e contava com promissores talentos, porém, ainda via o fantasma do rebaixamento rondando La Plata. Em 1965, chegou ao clube o treinador que mudaria para sempre a faceta de “time pequeno” do Estudiantes: Osvaldo Zubeldía. A diretoria do time alvirrubro exigiu do técnico distanciar o clube da zona de descenso. Zubeldía não prometeu nada, só disse que trabalharia muito, falaria pouco e que os resultados viriam em campo. Sem dinheiro, o time apostou em jogadores baratos para as próximas temporadas como Bilardo, Spadaro e Conigliaro, que se uniram aos talentosos jogadores da base do time (Poletti, Aguirre Suárez, Malbernat, Manera, Pachamé e Verón, este último o pai de Juan Sebastían Verón, que brilhou nas décadas de 90 e 2000). Pronto. A base estava formada. Será que a equipe conseguiria se manter na primeira divisão?
Começando a escrever a história
Depois de ostentar um sétimo lugar no Campeonato Nacional de 1966, o Estudiantes fez história em 1967. A equipe se tornou a primeira fora do chamado “grupo dos grandes” a vencer um campeonato oficial na era profissional do futebol argentino. O time conquistou o Campeonato Metropolitano, que foi realizado pela primeira vez no país e reunia as equipes concentradas na região central da Argentina, sem os clubes do interior. Na fase de classificação, o Estudiantes ficou na segunda posição, com 11 vitórias, sete empates e quatro derrotas em 22 jogos, atrás apenas do grande Racing, então campeão da América. O time se classificou para as semifinais e enfrentou o Platense, no estádio La Bombonera. A equipe de Zubeldía perdia por 3 a 1 e ainda estava com um jogador a menos quando aquele time deu provas de que era especial. Os alvirrubros conseguiram uma virada espetacular por 4 a 3 e se classificaram para a final. Dias depois, o Estudiantes encarou na final do campeonato o poderoso Racing, no estádio El Gasómetro. Quem esperava uma vitória fácil dos campeões da América levou a pior. O Estudiantes venceram por categóricos 3 a 0, com direito a golaço de bicicleta de Verón, e conquistaram o título. A festa foi enorme e a equipe dava a primeira mostra de que muita coisa ainda iria acontecer. O time ainda foi vice-campeão invicto do torneio nacional e seria vice do Metropolitano de 1968. A história estava apenas começando.
Pronto para a América
O Estudiantes já tinha seu estilo de jogo e todas as ferramentas para ir bem na Copa Libertadores de 1968. A equipe de Zubeldía cultuava a bola parada, os movimentos coletivos e as jogadas ensaiadas. Outros trunfos brilhantes eram as impecáveis linhas de impedimento, a catimba, os escanteios fechados e a máxima “defender primeiro, atacar depois”. E como defendia aquele Estudiantes… Com uma zaga fortíssima em tempos de futebol ofensivo, a equipe era um pesadelo para os adversários, que começaram a sofrer a nível continental naquele ano de 1968. O time argentino esteve no Grupo 1, ao lado de Independiente (ARG), Deportivo Cali (COL) e Millonarios (COL). A equipe de La Plata fez uma campanha impecável com cinco vitórias e um empate em seis jogos, com destaque para as vitórias fora de casa contra Independiente (4 a 2), Millonarios (1 a 0) e Deportivo Cali (2 a 1). Em casa, show contra o Deportivo (3 a 0) e Independiente (2 a 0). O empate foi sem gols, em casa, contra o Millonarios. Com 12 gols marcados e apenas três sofridos, a equipe estava embalada e forte para o decorrer da competição.
Na segunda fase, nova etapa de grupos, mas desta vez com três equipes cada. O time venceu três jogos e perdeu apenas um dos quatro que realizou, deixando para trás novamente o rival Independiente e os peruanos do Universitario. Na semifinal, embate épico contra o Racing, que defendia seu título continental. No primeiro jogo, em La Plata, goleada do Estudiantes por 3 a 0. Na volta, em Avellaneda, o Racing venceu por 2 a 0 e forçou a terceira partida (na época, ainda contavam os pontos, e não gols). O jogo decisivo terminou empatado em 1 a 1, e o Estudiantes avançou para a final, aí sim, graças ao critério de gols marcados. Era hora de fazer história.
Reis americanos
Na final, o time argentino encarou o Palmeiras, que tinha o mito Ademir da Guia e craques como Dudu, Baldocchi, Osmar e Tupãzinho. No primeiro jogo, em La Plata, a equipe argentina apostou na força de sua torcida e de seu conjunto e venceu por 2 a 1, gols de Verón e Eduardo Flores. Na volta, no Pacaembu, o Palmeiras conseguiu a proeza de marcar três gols na equipe argentina e venceu por 3 a 1, forçando a terceira partida. Em campo neutro, no estádio Centenário, em Montevidéu (URU), o Estudiantes liquidou os brasileiros com um gol em cada tempo: Ribaudo, aos 13´, e Verón, aos 82´. Os alvirrubros conquistavam pela primeira vez a Copa Libertadores e atingiam um patamar histórico que nem mesmo três dos grandes clubes argentinos (Boca, River e San Lorenzo) haviam alcançado: o topo da América.
Prontos para o mundo
Muitos criticavam o estilo de jogo do Estudiantes naquele ano de 1968 pelo fato de o time defender muito e não usar o estilo ofensivo em voga naquela época. O técnico Zubeldía dava de ombros e não ligava, enfatizando que “o que importa é ganhar”. Mas os críticos deveriam prestar era mais atenção nos talentos que aquele Estudiantes tinha. A zaga era fortíssima com Poletti, Manera, Madero, Aguirre Suárez e Malbernat. O meio de campo era “pegador” com Pachamé, Torgnari e Bilardo. E o ataque sempre anotava ao menos um gol com Flores, Ribaudo, Conigliaro e La Bruja Verón. Jogar contra os alvirrubros era um desafio tremendo. Só gente grande conseguia derrotar os comandados de Zubeldía. E um gigante estaria no caminho dos argentinos no final daquele ano de 1968, no Mundial Interclubes: o Manchester United de Bobby Charlton, Denis Law e George Best.
Bacharelado mundial
O Estudiantes teve que enfrentar o campeão europeu, Manchester United, na final do Mundial de 1968. O time inglês fazia história no Velho Continente com partidas fantásticas de seu trio Charlton-Law-Best, jogava com velocidade e magia e tinha um leve favoritismo, afinal, o Estudiantes também fazia bonito em casa e fora dela com o forte esquema defensivo e o futebol planejado de Zubeldía. No primeiro jogo, na Argentina, os alvirrubros escolheram a Bombonera para “receber bem” os ingleses. Com muita pressão e a famosa catimba, os donos da casa venceram por 1 a 0, gol de Conigliaro. Na volta, os argentinos também enfrentaram a hostilidade e foram chamados de “animais” pelos torcedores ingleses em Old Trafford. O Estudiantes tinha a dura missão de ao menos empatar para levar mais um título mundial para a Argentina (o Racing fora campeão em 1967). A equipe não se intimidou e abriu o placar logo nos primeiros 10 minutos com Verón. A partir daí, o time conseguiu neutralizar as principais jogadas dos ingleses, usou e abusou de sua força defensiva e levou um gol quando podia, no final do jogo: 1 a 1. O resultado deu o inédito e incrível título mundial ao Estudiantes. O time se tornava o primeiro e único clube não inglês a comemorar um caneco dentro do mítico estádio do Manchester United. Feito histórico! Era a consagração definitiva dos garotos que viraram homens. E que transformaram o Estudiantes num gigante do futebol mundial.
Novo ano dourado
No começo de 1969, o Estudiantes faturou mais um torneio internacional: a extinta Copa Interamericana, contra o Toluca, do México. O torneio era disputado entre os campeões da Libertadores e da Copa da Concacaf. Depois de uma vitória para cada equipe, sendo que ambas venceram fora de suas casas, foi disputado um terceiro jogo, no Uruguai, para definir o campeão. Na partida derradeira, vitória do Estudiantes por 3 a 0 e mais um título para os alvirrubros.
Na sequência da temporada, o time não foi bem nos torneios em casa e não conseguiu títulos, focando apenas na Libertadores. Por ser o campeão de 1968, o time entrou direto nas semifinais de 1969. A equipe derrotou a Universidad Católica por 3 a 1 no primeiro jogo e 3 a 1 no segundo, indo para a final. Na decisão contra o Nacional, do Uruguai, a equipe mostrou a maturidade e frieza necessárias para conquistar o bicampeonato da América, ao vencer os uruguaios em Montevidéu, por 1 a 0, e por 2 a 0 na Argentina. Em apenas quatro jogos, e com 100% de aproveitamento, o Estudiantes era bicampeão da América e igualava o feito do Independiente da metade daquela década de 60. O time teria mais uma chance de conquistar o mundo.
Pancadaria e vice
O Estudiantes enfrentou o Milan (ITA) na final do Mundial Interclubes de 1969. Na época, não era mais necessário três partidas para definir o campeão, que seria conhecido pelo saldo de gols em caso de uma vitória para cada equipe. No primeiro jogo, em Milão, os italianos colocaram o Estudiantes na roda e fizeram 3 a 0, gols de Sormani (2) e Combin. Na volta, no estádio La Bombonera, os argentinos apostaram na força e na “porrada” para sair com a vitória, que veio (2 a 1), mas insuficiente para dar o caneco aos alvirrubros, que perderam no placar agregado (4 a 2). Ao final do jogo, muita briga com direito a três jogadores do Estudiantes na delegacia: Poletti, Manera e Aguirre Suárez.
Primeiro tri
Novamente sem olhos para a Argentina, o Estudiantes abusou da condição de campeão e entrou de novo na semifinal da Libertadores de 1970. O time encarou o poderoso River Plate e venceu os dois jogos: 1 a 0, na casa do River, e 3 a 1, jogando em La Plata. Na final, o time encarou o sempre mítico Peñarol (URU). No primeiro jogo, na Argentina, vitória alvirrubra por 1 a 0, gol de Togneri. Na volta, força defensiva, catimba e empate sem gols, que garantiu o tricampeonato consecutivo ao clube de La Plata. Era a primeira vez que um clube conquistava a Libertadores três vezes seguidas, e o Estudiantes se tornava o primeiro clube da Argentina tricampeão continental, ganhava a posse definitiva da taça da Libertadores e igualava o feito do uruguaio Peñarol (campeão em 1960, 1961 e 1966). Os comandados de Zubeldía tinham mais uma chance de conquistar o bicampeonato mundial.
Favoritismo não ajuda
Poucas vezes uma equipe da América do Sul foi tão favorita na disputa do Mundial Interclubes quanto o Estudiantes em 1970. O time tinha pela frente o Feyenoord, da Holanda, então campeão europeu e primeiro neerlandês a conseguir a façanha. Os argentinos apostaram novamente na Bombonera para construir uma boa diferença de gols e ir tranquilo para a Holanda. Echecopar e Verón abriram 2 a 0 logo no primeiro tempo para os donos da casa e inflaram a torcida alvirrubra. A vantagem era ótima e poderia deixar a equipe tranquila para a volta. Mas, no segundo tempo, os holandeses empataram com Van Hanegem e Kindvall, calando os mais de 51 mil torcedores. Abalado, o time foi para a Holanda com a obrigação de vencer, mas perdeu por 1 a 0, dando adeus ao sonho de conquistar o bicampeonato mundial. Ali, começaria a decadência do “novo grande argentino”.
Fim do melhor Estudiantes de todos
Em 1971, já sem o lendário técnico Zubeldía, o Estudiantes não repetiu o brilho dos anos anteriores e caiu de produção. A equipe não foi bem novamente nos torneios nacionais e perdeu a chance do tetra da Libertadores na final contra o Nacional (URU), que conseguiu a revanche da derrota de 1969. Ali, terminava de vez a fase mais dourada de um time que espelhou outros tantos outros na Argentina pelo estudo do adversário, pela concentração antes dos jogos, pela importância das jogadas ensaiadas e pelo uso da catimba e da força defensiva. Acima de tudo isso, muita disciplina e planejamento. Aquele Estudiantes pode não ter sido brilhante e bonito de se ver jogar, mas entrou para a história com títulos incríveis, jogos memoráveis e por colocar um intruso num grupo seleto dos grandes da Argentina, que tiveram que reconsiderar a alcunha e incluir um time imortal.
Os personagens:
Poletti: era muito bem protegido pelo forte esquema defensivo do Estudiantes, e também ajudava com grandes defesas. Falastrão e provocador, Poletti enervava os adversários.
Madero: era firme quando preciso, mas elegante na maioria das vezes. Madero foi um dos grandes defensores da história do Estudiantes e do final da década de 60. Jogou de 1963 até 1969 na equipe de La Plata e virou ídolo, conquistando o Mundial Interclubes de 1968.
Malbernat: líder e uma das estrelas da equipe, Óscar Malbernat foi o capitão do Estudiantes de 1967 e 1972, sendo o responsável por levantar as três Libertadores, o Mundial e o Argentino vencidos pela equipe no período. Era a segurança na zaga do time e peça chave no esquema do técnico Zubeldía. Ídolo do clube.
Aguirre Suárez: zagueiro viril e muitas vezes violento, Aguirre Suárez intimidava os adversários com muita catimba e hostilidade, marcas daquele Estudiantes. Fez parte do grande esquadrão multicampeão da América de 1966 até 1971.
Medina: outro jogador fundamental no esquema tático de Zubeldía e firme na marcação e na construção da famosa linha de impedimento da equipe.
Pachamé: cheio de garra, Pachamé era uma das grandes referências do meio de campo do Estudiantes. Duro e sem brincadeiras, também usava a catimba e a força para parar os adversários. Fez uma dupla histórica e sempre lembrada com Bilardo.
Bilardo: era um dos craques do time, gênio tático, alto, líder e impecável na marcação e atuação no meio de campo. Carlos Bilardo virou um dos maiores ídolos da história do Estudiantes e marcou época com suas atuações. Virou técnico depois de pendurar as chuteiras e conquistou a Copa do Mundo de 1986 comandando a seleção argentina que tinha a estrela Maradona no elenco.
Togneri: podia jogar tanto na zaga quanto no meio de campo, e era pegador e duro na marcação em ambas as posições. Conquistou quase tudo no período em que esteve no clube, de 1968 até 1975, e entrou para a história ao ser campeão mundial com o time em 1968.
Flores: talentoso atacante, Eduardo Flores foi um dos jovens revelados pelo clube de La Plata que brilhou naquela década de 60. Jogou de 1962 até 1971 no time alvirrubro e marcou muitos gols importantes. Em partidas nacionais, foram 65 tentos em 165 jogos.
Ribaudo: era atacante, mas não marcava muitos gols, fazendo mais o papel de pivô e de dar passes para os companheiros. Mesmo assim, quando marcava os seus, era sempre em momentos decisivos, como na Libertadores de 1968, ao abrir o placar da vitória por 2 a 0, que deu o primeiro caneco continental ao time de La Plata.
Conigliaro: fez uma dupla inesquecível com Verón no ataque do Estudiantes. Rápido, dono de muita técnica e habilidoso, Marcos Conigliaro foi ídolo e imortal no time de La Plata, marcando gols e servindo brilhantemente o genial companheiro Verón.
Echecopar: outro atacante revelado pelo Estudiantes. Muito habilidoso e rápido, era coadjuvante devido à concorrência com Conigliaro e Verón. Mesmo assim, entrou para a galeria de ídolos do time com ótimos jogos e gols marcantes.
Verón: ganhou o apelido de La Bruja pelas barbaridades que fazia com a bola, pela técnica formidável e pelo faro de gol inconfundível. É, sem dúvida, o maior ídolo da história do Estudiantes e uma lenda, responsável direto pelos títulos e sucessos da equipe naquele final de década de 60. É pai de outra lenda do clube, Juan Sebastían Verón, que repetiu a façanha do patriarca e conquistou uma Libertadores para o time em 2009.
Osvaldo Zubeldía (Técnico): lenda do Estudiantes, Zubeldía foi o responsável por transformar o clube de La Plata em um dos times mais temidos do planeta de 1968 até 1970. Inovou a maneira de se jogar futebol, implantou a concentração, o estudo do adversário, a linha de impedimento e o forte esquema defensivo, além de colocar a raça na ponta da chuteira de cada jogador. Zubeldía mostrou que com um pouco de manha e catimba se vence adversários tecnicamente superiores ou que não conseguem controlar os nervos. Um mito do Estudiantes.
imortal do futebol
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