8 de fevereiro de 1250: cruzados e a dinastia Ayyubid defrontam-se na batalha de Al Mansurah, no Egito.
8 de fevereiro de 1904: torpedos nipónicos bombardeiam Port Artur, desencadeando a Guerra Russo-Japonesa.
8 de fevereiro 2020: eclode a batalha do Dragão, entre os dois pesos pesados do futebol nacional.
Aquele que é cada vez mais o grande Clássico do futebol português pode dentro de muitos, muitos anos reduzir-se a uma nota de rodapé num livro de história, mas para quem o vive é como se toda a existência se resumisse ali, a 90 minutos.
Esta noite, voltou a ser assim. Futebol, sim, mas espírito guerreiro à flor da relva e emoções à flor da pele nas bancadas. Um jogo com 50 mil nas bancadas e mais de 40 milhões em jogo – já que só o título vale o apuramento direto para a Liga dos Campeões.
O Benfica chegou ao Dragão com sete pontos de avanço e saiu com quatro, vergado a um 3-2 justo. Aquele que foi apenas o segundo jogo não ganho em 20 nesta Liga para os encarnados foi, não por coincidência, a segunda derrota frente ao FC Porto.
2-0 em clássicos para os azuis e brancos, primeiro ganho por Sérgio Conceição no Dragão. Com 14 jornadas por disputar, temos campeonato.
Sem Gabriel, que por problemas de saúde ficou fora da convocatória, mas com Weigl, recuperado, no onze junto a Taarabt ao meio, o Benfica apresentou-se num 4-2-3-1, com Pizzi e Rafa pelos flancos e Chiquinho nas costas de Carlos Vinícius.
O FC Porto surgiu em campo com Pepe, recuperado um mês depois (após a lesão no clássico de Alvalade), Corona a lateral e num 4-4-2 em que Otávio fechava à direita e Marega fazia dupla de ataque com Soares.
Os dragões entraram em campo em voo rasante e a fumegar. Aos 10 minutos já Sérgio Oliveira abria o marcador após Otávio sentar Grimaldo.
A bicada das águias demoraria, no entanto, apenas alguns minutos, quando Marchesín evitou um chapéu num desvio de cabeça de Chiquinho, após cruzamento de Rafa, mas já nada conseguiu fazer para evitar a antecipação de Vinícius.
18 minutos, um golo para cada lado e ambiente em ebulição num dos melhores FC Porto-Benfica dos últimos tempos. O caldeirão do Dragão iria efervescer ainda mais nos momentos finais da primeira parte.
Primeiro um penálti de Ferro, por mão na bola, que Telles converteu. Minutos depois, os centrais do Benfica em xeque: Marega ganhou a Ferro, que sentiu muitas dificuldades em travar a velocidade e poderio físico do maliano, e cruzou para Rúben Dias fazer autogolo.
O 3-1 ao intervalo (com o FC Porto a ganhar em remates, 8-3, e posse de bola, 54%-46%) seria minimizado logo no arranque da segunda parte. Por Vinícius, pois claro, de novo com Rafa a servir, naturalmente. O brasileiro fez o mesmo que César Brito, Nuno Gomes e Lima e bisou no reduto portista, sem, contudo, ter o mesmo final feliz.
O Benfica viveu sobretudo disso. Do acerto de Vinícius e a velocidade e qualidade de passe de Rafa. Bem como, a espaços, da souplesse de Taarabt.
O FC Porto mostrou mais. No meio-campo teve Otávio, desequilibrador e com garra, Uribe, pendular, e sobretudo Sérgio Oliveira, sempre ligado em cada disputa e pronto a disparar a sua meia distância temível, que acabou por fazer o seu melhor jogo da época. Houve também Corona, apesar de muito recuado, e Díaz. Os reis dos túneis. Artistas de serviço, que mesmo com a partida a ferro e fogo faziam por recordar como o futebol também é arte.
Não há batalha sem generais. E ao minuto 65 Lage trocou Taarabt, em risco, para colocar Seferovic ao lado de Vinícius, puxando Chiquinho para o meio.
Não resultou, o Benfica sentia-se desconfortável e foi até ao final sobretudo futebol direto, acabando o com três avançados centro em campo com a estreia do reforço Dyego Sousa.
Conceição ganhou na estratégia. Apostou na contenção, lançando Mbemba, Manafá e o futuro craque Vítor Ferreira. E quase matou o jogo nos descontos.
A batalha do Dragão acabaria com o impressionante registo de Bruno Lage, que até esta noite havia vencido em todos os 18 jogos para o campeonato como visitante.
O FC Porto de Conceição teve arte, teve engenho, mas foi sobretudo guerreiro do costume, fazendo das tripas coração – lema caro à Invicta – segue agarrado ao sonho da reconquista do título.
Não por acaso, tornou-se popular a frase de o futebol ser «a continuação da guerra por outros meios».
Mesmo que obrigado pelas contingências, não será só de hoje que os dragões são quem melhor entende que um FC Porto-Benfica é mais do que um jogo. É um combate. Ganha quem mais luta e quem sabe sofrer.
Esta noite, ganhou um dragão que se recusa render.
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